Trabalho por aplicativo no Brasil sobe junto com insegurança da rotina e falta de direitos

Segundo o IBGE, essas pessoas enfrentam jornadas longas, ganham menos por hora e há uma forte taxa de informalidade Entra no carro, coloca o cinto, vira a chave e logo surgem, na tela do celular, notificações de corridas nas redondezas. Há nove anos, essa é a rotina do motorista de aplicativo Hebert Charles, das 4h30 às 11h, e, segue após um breve intervalo, das 16h às 20h. O carioca conciliava a atividade com um emprego formal até o final da pandemia -quando passou a trabalhar somente com transporte de aplicativo. Aos 34 anos, Hebert reclama da insegurança que sente nas ruas e da falta de transparência nos valores pagos por corrida pelas plataformas. Um dos maiores desafios do motorista de aplicativo que eu vejo é a falta de segurança nas ruas, principalmente. Nós não temos onde parar para aguardar a corrida, enfim. Também os valores que hoje existem nos aplicativos… não são transparentes no valor que você está ganhando. Assim, uma viagem de 10 quilômetros, por exemplo, tem hora que o aplicativo paga 40 e tem hora que ele paga 29, assim, não tem um critério para o porquê dessa diferença com uma quilometragem igual O motorista do Rio de Janeiro faz parte das 964 mil pessoas que fazem transporte de passageiros por aplicativos. O número representa 58% do total dos brasileiros que trabalham em plataformas, segundo a Pnad Contínua do IBGE. A quantidade de pessoas que atuam por meio de plataformas digitais teve um crescimento de 25% em dois anos. Foi de 1 milhão e 300 mil, em 2022, para 1 milhão e 700 mil pessoas, no ano passado — equivalente a 2% dos trabalhadores do setor privado, considerando 88,5 milhões a população brasileira ocupada com idade de 14 anos ou mais. Hebert também representa o perfil típico da área: 84% são homens. Além disso, a maioria tem entre 25 e 39 anos, mora no Sudeste, tem ensino médio completo ou superior incompleto e atua por conta própria sem vínculo empregatício. O estudo ainda apontou que 29% do público inscrito em plataformas, ou seja 485 mil, fazem entregas. É o caso do André Freire. Na Bahia, região Nordeste, ele começou a usar a moto para percorrer as ruas de Salvador e levar a encomenda da loja até a casa do cliente antes da chegada dos aplicativos. Em 2018, Andre deixou o emprego com carteira assinada para se dedicar ao delivery. Hoje, conseguiu retornar ao vínculo formal, e usa as plataformas para complementar a renda, de onde tira, em média, R$1500. Sempre trabalhei com moto, serviços de entrega e delivery, bem antes de existir aplicativo. Em 2018, eu estava trabalhando de carteira assinada como entregador de farmácia. Com o crescimento dos aplicativos se tornando bastante chamativo, eu pedi demissão e tornei a minha vida financeira, como renda principal, dependente dos aplicativos. Tive a preferência de voltar para CLT. Hoje, uso o aplicativo apenas como complemento de renda. Além de transporte de passageiros e entrega, 18% dos traballhadores de plataformas prestam outros serviços. Segundo o IBGE, o rendimento médio dos chamados plataformizados foi de R$ 2.996, maior do que de quem está fora das plataformas - R$ 2.875. Por outro lado, esse grupo trabalha mais na semana — 45 horas contra 39 horas - e tem menor ganho por hora: R$ 15,40 contra R$ 16,80, como observa o analista da pesquisa Gustavo Geaquinto. A gente observou que para os níveis de escolaridade mais baixos, por exemplo, as pessoas sem sução ou fundamental incompleto ou com fundamental completo e médio incompleto, os trabalhadores plataformizados recebiam em média mais de 40% a mais do que os não plataformizados. Já para as pessoas com superior completo ocorria o contrário. Os trabalhadores plataformizados tinham um rendimento quase 30% inferior ao daqueles que não trabalhavam por meio de aplicativos de serviços. E entendes que essas diferenças no rendimento médio, elas podem ser explicadas ao menos parcialmente pelo perfil ocupacional dos trabalhadores. De acordo com o levantamento, sete em cada 10 brasileiros plataformizados estão na informalidade. E somente 36% contribuem para a Previdência, pouco mais da metade da taxa entre quem não trabalha por aplicativos -- 62%. A advogada Empresarial e Trabalhista Danielle Gomes classifica como fenômeno a alta de pessoas atuando por meio de aplicativos e pondera que a falta de uma legislação específica para o setor deixa a categoria sem direitos básicos. A uberização é um fenômeno que tem ganhado cada vez mais força no Brasil, principalmente entre os motoristas de aplicativos, entregadores e profissionais que atuam dentro das plataformas digitais. Todo trabalhador que presta um serviço de forma pessoal, habitual, remunerada, deve ter reconhecido um vínculo empregatício com acesso a direitos básicos, como férias remuneradas, décimo terceiro, salário, FGTS e horas extras. A ausência de regulamentação específica para o trabalho em plataformas tem deixado esses profissionais sem auxílio jurídico, muitas vezes sem garantias trabalhistas ou segurança mínima. Apesar das jornad

Trabalho por aplicativo no Brasil sobe junto com insegurança da rotina e falta de direitos

Segundo o IBGE, essas pessoas enfrentam jornadas longas, ganham menos por hora e há uma forte taxa de informalidade Entra no carro, coloca o cinto, vira a chave e logo surgem, na tela do celular, notificações de corridas nas redondezas. Há nove anos, essa é a rotina do motorista de aplicativo Hebert Charles, das 4h30 às 11h, e, segue após um breve intervalo, das 16h às 20h. O carioca conciliava a atividade com um emprego formal até o final da pandemia -quando passou a trabalhar somente com transporte de aplicativo. Aos 34 anos, Hebert reclama da insegurança que sente nas ruas e da falta de transparência nos valores pagos por corrida pelas plataformas. Um dos maiores desafios do motorista de aplicativo que eu vejo é a falta de segurança nas ruas, principalmente. Nós não temos onde parar para aguardar a corrida, enfim. Também os valores que hoje existem nos aplicativos… não são transparentes no valor que você está ganhando. Assim, uma viagem de 10 quilômetros, por exemplo, tem hora que o aplicativo paga 40 e tem hora que ele paga 29, assim, não tem um critério para o porquê dessa diferença com uma quilometragem igual O motorista do Rio de Janeiro faz parte das 964 mil pessoas que fazem transporte de passageiros por aplicativos. O número representa 58% do total dos brasileiros que trabalham em plataformas, segundo a Pnad Contínua do IBGE. A quantidade de pessoas que atuam por meio de plataformas digitais teve um crescimento de 25% em dois anos. Foi de 1 milhão e 300 mil, em 2022, para 1 milhão e 700 mil pessoas, no ano passado — equivalente a 2% dos trabalhadores do setor privado, considerando 88,5 milhões a população brasileira ocupada com idade de 14 anos ou mais. Hebert também representa o perfil típico da área: 84% são homens. Além disso, a maioria tem entre 25 e 39 anos, mora no Sudeste, tem ensino médio completo ou superior incompleto e atua por conta própria sem vínculo empregatício. O estudo ainda apontou que 29% do público inscrito em plataformas, ou seja 485 mil, fazem entregas. É o caso do André Freire. Na Bahia, região Nordeste, ele começou a usar a moto para percorrer as ruas de Salvador e levar a encomenda da loja até a casa do cliente antes da chegada dos aplicativos. Em 2018, Andre deixou o emprego com carteira assinada para se dedicar ao delivery. Hoje, conseguiu retornar ao vínculo formal, e usa as plataformas para complementar a renda, de onde tira, em média, R$1500. Sempre trabalhei com moto, serviços de entrega e delivery, bem antes de existir aplicativo. Em 2018, eu estava trabalhando de carteira assinada como entregador de farmácia. Com o crescimento dos aplicativos se tornando bastante chamativo, eu pedi demissão e tornei a minha vida financeira, como renda principal, dependente dos aplicativos. Tive a preferência de voltar para CLT. Hoje, uso o aplicativo apenas como complemento de renda. Além de transporte de passageiros e entrega, 18% dos traballhadores de plataformas prestam outros serviços. Segundo o IBGE, o rendimento médio dos chamados plataformizados foi de R$ 2.996, maior do que de quem está fora das plataformas - R$ 2.875. Por outro lado, esse grupo trabalha mais na semana — 45 horas contra 39 horas - e tem menor ganho por hora: R$ 15,40 contra R$ 16,80, como observa o analista da pesquisa Gustavo Geaquinto. A gente observou que para os níveis de escolaridade mais baixos, por exemplo, as pessoas sem sução ou fundamental incompleto ou com fundamental completo e médio incompleto, os trabalhadores plataformizados recebiam em média mais de 40% a mais do que os não plataformizados. Já para as pessoas com superior completo ocorria o contrário. Os trabalhadores plataformizados tinham um rendimento quase 30% inferior ao daqueles que não trabalhavam por meio de aplicativos de serviços. E entendes que essas diferenças no rendimento médio, elas podem ser explicadas ao menos parcialmente pelo perfil ocupacional dos trabalhadores. De acordo com o levantamento, sete em cada 10 brasileiros plataformizados estão na informalidade. E somente 36% contribuem para a Previdência, pouco mais da metade da taxa entre quem não trabalha por aplicativos -- 62%. A advogada Empresarial e Trabalhista Danielle Gomes classifica como fenômeno a alta de pessoas atuando por meio de aplicativos e pondera que a falta de uma legislação específica para o setor deixa a categoria sem direitos básicos. A uberização é um fenômeno que tem ganhado cada vez mais força no Brasil, principalmente entre os motoristas de aplicativos, entregadores e profissionais que atuam dentro das plataformas digitais. Todo trabalhador que presta um serviço de forma pessoal, habitual, remunerada, deve ter reconhecido um vínculo empregatício com acesso a direitos básicos, como férias remuneradas, décimo terceiro, salário, FGTS e horas extras. A ausência de regulamentação específica para o trabalho em plataformas tem deixado esses profissionais sem auxílio jurídico, muitas vezes sem garantias trabalhistas ou segurança mínima. Apesar das jornadas longas e menor rendimento por hora, o número de trabalhadores de aplicativos segue crescendo, o que reforça o peso das plataformas no mercado de trabalho.